quinta-feira, 2 de setembro de 2010

QUÍMICA FORENSE: A ATUAÇÃO DO QUÍMICO NO CONTEXTO DA PERÍCIA CRIMINAL

      A Química em todas as suas modalidades é instrumento de interesse à área Forense, sendo utilizada por esta área de forma isolada ou associada a outras ciências, já que uma única investigação em um laboratório forense pode envolver vários tipos de cientistas. Portanto, a Química Forense é uma subdivisão da grande área do conhecimento que é a Ciência Forense e se encarrega da análise, classificação e determinação de elementos ou substâncias encontradas nos locais de averiguação ou ocorrência de um delito ou que podem estar relacionadas a este.

     A Química Forense continua expandindo, tornando-se cada vez mais necessária, diante da criminalidade que ao longo dos anos tem evidenciado uma face sofisticada e procedimentos complexos de atuação. Esse segmento da Química é um meio seguro e eficaz na elucidação dos crimes de diversas naturezas com o uso de técnicas de diferentes leituras destinadas a este fim. Neste cenário, o químico assume fundamental papel no que concerne aos avanços e estudos de casos criminais.

     As técnicas instrumentais de análise química aqui selecionadas, oferecem resultados precisos, atendendo às necessidades de análises relativas a um grande número de materiais coletados em ocorrências policiais. Por Cromatografia Gasosa podem ser analisadas as drogas dos grupos Anfetaminas, Metanfetaminas, Xantina, Anestésico e Alcalóide, determinação de cocaína em urina, álcool no sangue e álcool e ésteres em bebidas alcoólicas. Por Espectrometria de Massa determinam-se: arsênio em urina, sangue e estômago, adulteração em fármacos e bebidas, autenticidade de perfumes e obras de arte, resíduos de disparo de armas, rastreamento e identificação de drogas ilícitas (heroína, cocaína, maconha, ecstasy) e a origem de bactérias e esporos em crimes biológicos. Através da Fluorescência de Raios X, identificam-se: resíduos de disparos de arma de fogo, procedência de drogas, alterações de moedas e cédulas (análise de pigmentos), traços de evidência de cena de crime (fragmentos de terra, areia, vidro, fibras, tecidos). O uso das técnicas supracitadas, aplicadas à área de Criminalística, gerou melhoria na qualidade das elucidações de casos de naturezas policiais, produzindo evidências sólidas para que as autoridades possam formar suas livres convicções a respeito da materialidade das provas apresentadas, facilitando assim o julgamento e a elaboração da sentença judicial.

     Cientistas partem de um princípio básico da Química Forense que é o fato irrefutável de que todo e qualquer tipo de contato deixa um rastro e de posse das pistas, torna-se possível o início das análises, que devem dispor de equipamentos com sensibilidade e exatidão apropriadas para cada caso a ser investigado. Diante disso, químicos, juntamente com outros profissionais da área forense, ao aliarem a aplicação de seus conhecimentos científicos com os devidos recursos técnicos, oferecerão laudos periciais de qualidade, com vistas ao andamento processual mais prático e sentenças mais justas.

Técnica permite identificar origem de drogas e tipos de armas

Assinatura digital química ajuda polícia técnica a rastrear origem da maconha apreendida e apontar armas utilizadas em crimes


Foto: Eduardo Zocchi


No disparo de uma arma, os metais presentes no gás formado apresentam diferentes padrões de dispersão


O grupo de pesquisas em química forense do Centro de Química e Meio Ambiente do Ipen e o Centro de Análises e Pesquisas do Instituto de Criminalística (CEAP) do Estado de São Paulo receberam reconhecimento no país e do exterior pelas novas metodologias desenvolvidas que permitem o rastreamento da cannabis sativa (maconha) encontrada nas principais cidades do país. Até o desenvolvimento da pesquisa todas as informações sobre a origem da droga dependiam de apreensões em locais de plantio e da declaração dos portadores, o que dificultava as investigações policiais.

Com o método introduzido no país em 2000, a história começou a mudar. A técnica consiste em analisar amostras de maconha apreendidas em grandes centros urbanos, utilizando sofisticados equipamentos que fazem uma caracterização química e isotópica precisa. O estudo identifica elementos químicos que se relacionam com a climatologia, condições de plantio e características geoquímicas do local.

Os pesquisadores Jorge Eduardo Sarkis, líder científico do projeto no Ipen, e o diretor do CEAP e coordenador técnico das pesquisas Osvaldo Negrini Neto apontam como fatores de sucesso a cooperação da Polícia Científica de nove Estados (AC, AP, BA, CE, MA, PA, PE, MS, PR) e o uso de técnicas de última geração. Apenas o Brasil e a Austrália desenvolvem trabalhos como esse. Programa similar deve ser implementado nos Estados Unidos.
Os Estados forneceram amostras apreendidas pela Polícia Civil. As coletas foram feitas de acordo com os padrões estabelecidos pela pesquisa, que faz parte de um convênio do Ipen com o Instituto de Criminalística de São Paulo. O estudo está incluído no âmbito dos projetos de Políticas Públicas apoiados pela Fapesp.

As pesquisas relacionadas ao disparo de armas estão permitindo a resolução de diversos casos reais. Consistem em identificar os metais, que se acumulam ou espalham de maneira diferente para cada tipo de armamento e munição. Na primeira fase do estudo, 200 voluntários civis fizeram disparos com diferentes tipos de armas. Em seguida, foi possível estabelecer um padrão de distribuição (assinatura química) para cada tipo de arma.

O princípio do método está baseado no fato de que cada arma é disparada com determinada energia e temperatura. Os metais presentes no gás que é formado apresentam diferentes padrões de dispersão, segundo sua massa.

De acordo com a suspeita, se homicídio ou suicídio, a técnica possibilita avaliar as regiões de interesse (dorso e palma das mãos do atirador, local atingido pela bala, mucosas, regiões próximas à perfuração, entre outros), identificar os metais e indícios do tipo de arma utilizado, confirmando ou desmentindo elementos dos autos da investigação. Foi o caso de um possível suicídio na Paraíba, que, após a exumação, os exames mostraram que se tratava de homicídio. Diante das provas, o suspeito confessou o crime.
A metodologia permite identificar o tipo de armamento em função do alvo e da distância do disparo. As roupas da vítima e do atirador podem também ajudar a levantar indícios do tipo de arma utilizada. Até mesmo uma munição tida como indetectável, a 9mm Clean Range, pode ser identificada.

Em colaboração com o Instituto de Biociências da USP, os cientistas começam a realizar o seqüenciamento genético da maconha, analisando seu DNA. Com a técnica, será possível descobrir possíveis alterações para melhorias na planta, as chamadas super-drogas.
Negrini explica que para o caso da cocaína o objetivo é rastrear a rota do tráfico, os pontos de distribuição e sua influência na cidade. Os pesquisadores investigam também o grau de pureza da droga, que é misturada pelos traficantes a diversos outros produtos, altamente danosos à saúde, para permitir maiores lucros. Em algumas amostras analisadas, encontrou-se menos de 15% de cocaína.